segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Ausência de políticas públicas: um gatilho para o extermínio da vida negra

Por Marineia Ferreira*
Alexandre Soares (colaboração) **
Fotos: Paloma Melissa ***


Segundo o Atlas da Violência de 2017, o Brasil registrou, em 2015, 59.080 homicídios. Isso significa 28,9 mortes a cada 100 mil habitantes, mais de 318 mil jovens foram assassinados no Brasil entre 2005 e 2015. Apenas em 2015, foram 31.264 homicídios de pessoas com idade entre 15 e 29 anos, uma redução de 3,3% na taxa em relação a 2014. Os homens jovens continuam sendo as principais vítimas: mais de 92% dos homicídios acometem essa parcela da população.

Estes dados apontam que a criminalidade ainda é o principal o fruto do descaso do poder público. Em Belém, somente este ano foram registradas oficialmente cerca de quatro chacinas nas quais vitimaram aproximadamente 47 pessoas e em sua maioria, negras. Diante dessa realidade, o Instituto Universidade Popular, por meio da Agência de Notícias Jovens Comunicadorxs da Amazônia em parceria com o Coletivo Tela Firme, Coletivo de Juventude Negra do Cedenpa, Fase Amazônia, Fundo Brasil de Direitos Humanos, Projeto Conexão de Saberes, entre outros, realizaram na ultima terça (19) na Paróquia São Domingos de Gusmão na Terra Firme, uma audiência pública para debater com a comunidade, sociedade civil e representantes do poder publico o Extermínio da Juventude Negra.

Anna Claudia Lins Oliveira 
Ouvidora do Sistema de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Pará

A audiência teve como objetivo provocar e alertar a sociedade civil e chamar a atenção do poder público para ás diversas formas de violência contra a juventude negra. O evento contou com a presença de moradores, lideranças populares, organizações do bairro e de outros, Comissão de Direitos Humanos e Igualdade Racial da OAB/Pa, Secretaria de Segurança Pública, Propaz Juventude, Unidade Integrada ProPaz, Frente Parlamentar de Juventude e Comissão de Direitos Humanos da  Assembléia Legislativa do Pará.

A programação iniciou com apresentação do vídeo “PODERIA TER SIDO VOCÊ!” produzido pelo Coletivo Tela Firme, trata-se de uma encenação que relembra quatro chacinas em Belém. Em seguida a jovem ativista negra Maynara Santana, estudante de nutrição e integrante do Coletivo de Juventude Negra do Cedenpa fez a leitura de uma carta-protesto, em que destacou “O genocídio do jovem negro passa a ter um peso ainda maior quando visto do espectro da história não é mesmo? Soa como algo planejado, arquitetado, caso pronto, feito, crime perfeito orquestrado pelo maestro mais cruel de todos os tempos: O RACISMO!”.

Maynara Santana - Cedenpa

Segundo Diego Teófilo, educador da Unipop, relata que desde quando se iniciou o processo de construção da mesma a proposta era romper com a formalidade das audiências quando são realizadas no espaço do parlamento e destacou “criar as condições e o espaço para que os presentes pudessem falar, era nosso principal objetivo, para aqueles que tem o papel no monitoramento e criação de políticas, neste caso o parlamento e poder executivo, e assim apresentar suas demandas”.

Entre os blocos da audiência foram realizadas diversas intervenções culturais de jovens da comunidade e de outras, entre eles Andrei Ribeiro, estudante de Serviço Social da UFPA, Demo Drew, 2KP, Street e DomMc. Durante as falas houve relatos e propostas de encaminhamento de moradores da comunidade, movimentos organizados e do poder público, entre eles: Formação de um grupo de trabalho para discutir e monitorar as recomendações apontadas pela CPI das Milícias em 2014; Desarquivamento dos processos da chacina de 2014, que envolvem policiais militares; e Criação de um grupo de dialogo da Terra Firme para discutir a reativação da antiga delegacia para transforma-la em um espaço de cultura para o bairro.

Intervenção cultural

Para Paloma Melissa, integrante da agência de notícias a audiência pública é uma forma de participação e de controle popular da Administração Pública no Estado Social e Democrático de Direito, que destacou “o bairro da Terra Firme, vítima de um processo de discriminação, marginalização e como se já não bastasse, de chacinas. A comunidade pôde participar da Audiência Pública feita por jovens da periferia conhecedores e vítimas de um sistema discriminatório, vozes foram ouvidas por parte dxs Representantes do Poder público à espera de uma resposta, proposta e ação na mudança do nosso quadro social que cada vez mais fica sangrento,  tornando jovens em especial a juventude negra vítimas de um apartheid social”.

Enquanto movimento social estamos vigilantes para que o direito humano aos jovens negros seja garantido e visibilizado por meio do nosso trabalho que é o de comunicar, contribuir no empoderamento e promover a autonomia, visto que a juventude precisa necessita ser protagonista de sua história e para isso, portanto, ela precisa estar viva e livre de qualquer resquício do racismo.

Sobre a Agência de Notícias Jovens Comunicadores da Amazônia
Agência de Notícias Jovens Comunicadores da Amazônia, é projeto realizado pelo InstitutoUniversidade Popular – UNIPOP, em parceria com o Fundo Brasil de DireitosHumanos, e parceira local com o Coletivo Tela Firme, Rede de Jovens Mais Pará e Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará – CEDENPA.
A Agência tem por objetivo a constituição de um espaço de mobilização contra extermínio de jovens negros e de visibilidade de práticas positivas desenvolvidas por coletivos, grupos, organizações sociais, entre outros nas periferias de Belém.

* Articuladora jovem da agência de notícias, estudante do curso técnico em Vigilância em Saúde e integrante da Rede de Mulheres Negras.
** Articulador jovem da agência de notícias e estudante de jornalismo.
*** Articuladora jovem da agência de notícias, estudante de Serviço Social e voluntária do Movimento Republica de Emaús.